Fabio.... não sei o que para ti é uma moto "velha" ou "antiga".
Mas este revivalismo a que assistimos hoje em dia, para mim, assenta especialmente em 3 nuances:
1º
Motos Portuguesas Portugal sempre teve tradição nas duas rodas, mas no âmbito das pequenas cilindradas, especialmente as 50cc. Por motivos de limitações nas habilitações e condições sociais, nos anos 50 e 60, não eram muitos os portugueses que conseguiam tirar a carta de condução (carteira de motorista, aí no Brasil). Deste modo, a única forma de terem acesso a um transporte próprio, era obterem a (extinta) licença camarária de ciclomotor, emitida pelas Câmaras Municipais (Prefeituras) e que apenas obrigava a um exame oral e prático simples. E foi assim que durante muitos anos, muitos dos nossos pais, avós e bisavós puderam ter o seu veículo. As denominadas "motorizadas", motos de baixa cilindrada com motores de 50cc (e algumas 125cc), a dois tempos enchiam as vilas e aldeias de Portugal em meados do sec. XX. O mercado era tão interessante que rapidamente surgiram e se implantaram varias marcas e construtores de motos Portugueses, uns produzindo inclusivé os seus motores, outros importando motores da Alemanha ou de Italia essencialmente. Marcas portuguesas de motos, como Famel, Casal, Macal, Vilar, Fundador, EFS, SIS, MVM, Pachancho, Anfesa, etc... prosperaram e dominaram o mercado das duas rodas motorizadas em Portugal.
Destes construtores, e até finais dos anos 90, praticamente todos fecharam portas (faliram) com a concorrência feroz estrangeira (com produtos mais apetecíveis e bonitos), tanto que hoje em dia apenas resta uma marca portuguesa ainda em actividade, a AJP, que até exporta para o Brasil.
Hoje, o fetiche pelas motorizadas nacionais voltou. Muitos restauram-nas e chegam a pedir valores exorbitantes por elas, muitas vezes mais do dobro ou triplo do preço de quando elas custavam novas, há 30, 40 anos ou 50 anos atrás (o nosso conceito de inflacção é completamente diferente desse que vocês têm aí).
2º
Revivalistas old-school Outras das vertentes desta "febre" em Portugal em torno das motos antigas assenta também nas clássicas de maior cilindrada. Ainda que estas fossem raras, há 30 / 40 anos atrás, havia sempre quem tinha posses para as ter. Muitas passaram de avós para pais, e depois para filhos, fechadas anos a fio em garagens. E com o boom do mercado motociclístico, a abertura e divulgação dos conhecimentos técnicos, estéticos e globalização do mercado de peças, muitas destas velhas motos foram renascidas... passaram de mãos.... outras foram importadas.... e hoje ter uma clássica, uma café-racer ou uma scrambler, tornou-se um fenómeno "trendy". Velhas motos made in Europe, desde BMW, Benelli, Norton, Triumph, juntam-se às clássicas japonesas dos seventies e eighties. São renovadas e reabilitadas, umas da forma mais original possível à época (o caso dos trabalhos do nosso parceiro aqui do forum, o Magjet)..... outras, adulterando completamente os modelos e criando em muitos casos aberrações estéticas e mecânicas e deflorando todo o conceito original da moto.
Esta ânsia é tanta, que à falta de material, como quem diz, de motos verdadeiramente vintage que sirvam como base, já se chega ao ponto de pegar em motos mais recentes, com 10 ou 20 anos, e transformá-las de forma grotesca em pseudo-clássicas, desvirtuando conceitos e formas de fazer. Não é raro ver utilitárias dos anos 90 e 2000 e até mesmo desportivas, transformadas em clássicas ou café-racers "mascaradas".
3º
Sport Classic O boom do mercado motociclístico em Portugal deu-se essencialmente em finais dos anos 80 e mais fortemente ao longo de toda a década de 90. Foi precisamente por esta altura, que com a franca melhoria das condições de vida em Portugal, a entrada no mercado europeu com a CEE (actual UE), e a consequente globalização, que ter uma moto de maior cilindrada se tornou possível à generalidade dos motociclistas portugueses.
E foi assim que ter uma desportiva se tornou moda. As marcas japonesas ditavam as leis neste domínio, e qualquer uma das 4 japonesas, numa guerra aberta de números, lançavam modelos de elevadas prestações numa concorrência feroz e aguerrida.
Era assim normal qualquer jovem na casa da vintena de anos querer ter uma destas sport, que decalcavam para a estrada a virilidade das motas de circuito pilotadas por Schwantz, Rainey, Kocinski, Doohan, Capirossi, etc....
Muitos deste jovens entretanto envelheceram e têm hoje 40 / 50 anos. Mas o desejo de poder continuar a ter as motos que os fascinaram nessas épocas é premente, daí que a procura por modelos desportivos, especialmente japoneses, dos anos 90, potentes e performantes, despojados de electrónica, e o mais fieis possíveis ao seu estado original, cresça.
Não admira por isso que CBR's, FZR's ZXR's, ZZR's, GSXR's, YZF's etc..... tenham bastante procura.... e se em estado original e bem cuidadas, valham valores elevados no mercado de usados.
Eu por exemplo, como sempre me fascinaram mais as europeias, não meto de parte a hipótese de ainda vir a ter uma destas desportivas mais clássicas, especialmente se for uma Duc 748/916/996/998, das quais sempre tive um especial fascínio. E ainda a semana passada vi uma 748, de meados de 90. Só que depois os preços pedidos são especulados e não se coadunam com a realidade da desvalorização que um veículo destes deveria ter.
Este fenómeno no entanto não ocorre apenas em Portugal. Vais a Espanha, a França, a Inglaterra, a Itália, à Alemanha, etc.... e as motos antigas ou clássicas convivem no dia a dia com as mais recentes produções do mercado motociclístico.
Como vês, Fábio, este "fetiche", não deriva de condições sociais das pessoas que as possuem, e muito menos da fasquia de uma remuneração mínima mensal de um país, mas de um fenómeno muito mais abrangente, que tem que ver com o culto da moto que se enraizou em quem nisto anda há mais de uma ou duas décadas, pelo menos.
Em Portugal existe um mítico local, que é a ponta mais ocidental da Europa Continental, a que se chama Cabo da Roca. Todos os domingos de manhã, durante todo o ano, este local é palco de uma concentração espontânea de motociclistas, que ali rumam com as suas máquinas. E ali podes ver o desfilar das mais recentes e modernas motos, algumas acabadas de matricular, até às clássicas de outros tempos, numa mescla de cores, marcas, estilos e modelos que abrangem de tudo.
![[Imagem: Pmg1kIz.jpg]](http://i.imgur.com/Pmg1kIz.jpg)
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Como já equacionei acima, não sei o que é para ti, Fábio, uma moto "antiga".... ou partir de quando consideras tal?
Eu, por exemplo, actualmente possuo uma BMW F800ST (que não existe aí no Brasil, pois segundo sei, a serie F resume-se à R e à GS. Por cá temos ainda a S, a ST e a GT). É de Janeiro de 2007, ou seja é uma moto que está em vias de completar 10 anos de matrícula e está à beira de perfazer 60 mil kms. No entanto se olhares para ela, não dizes de todo que ela tem a idade que tem e já andou o que o odómetro marca.
Tenho-a porque entre o que me fez escolhê-la quando a comprei, e no decorrer do tempo, ainda é uma moto que preenche os requisitos que coloco para a utilização e pretensão que faço dela. Já por várias vezes pensei em mudar e até já estive muito próximo disso. Mas depois quando começo a pesar os prós e contras de mudar para algo maior / melhor / mais recente, o que ganharia não é de tal forma notório, face ao que perderia, com a troca... para tomar a decisão final... e vou-me deixando ficar.
Não deixa de ser uma moto já com 10 anos. Ainda que aos meus olhos e dos demais, ela pareça ter saído a semana passada do stand.